Perseverança dos Santos por Kangaroodort (INDEX)

Perseverança dos Santos por Kangaroodort (INDEX)

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CONCLUSÃO (Romanos 9: Uma Leitura Arminiana Sob a Nova Perspectiva)

Conclusão

Conclusão

Então, para resumir, de acordo com a interpretação agostiniana/calvinista, que assume fé em Cristo para salvação e surgiu em oposição ao pelagianismo e à Igreja Católica Medieval:

Paulo começa o trecho angustiado pelo fato de Israel fracassar em vir à salvação pela fé em Cristo(Rm 9:1-5). A resposta de Paulo é que nem todos os de Israel são Israel – isto é nem todo israelita é eleito (Rm 9:6). Paulo demonstra que a prerrogativa de Deus eleger quem ele quer, mostrando a eleição de Isaque sobre Ismael e de Jacó sobre Esaú (Rm 9:7-13). Deus tem misericórdia apenas de quem Ele escolhe ter misericórdia, e endurece os restantes, como exemplificado por Faraó (Rm 9:14-18). Neste ponto, Paulo imagina um interlocutor que articula a disputa arminiana: se Deus escolheu endurecer alguém como Faraó, como pode Deus então julgá-lo pelo que ele estava predestinado a fazer?(Rm 9:19) Paulo repreende o interlocutor pela sua impiedade, e usa a alegoria oleiro-barro para reiterar que Deus tem o direito de eleger alguns e reprovar outros como Ele julgar conveniente (Rm 9:20-21). Paulo então acrescenta, como argumento de apoio, o fato de que quando Deus escolhe reprovar alguém como Faraó, ele tem que suportar pacientemente seu pecado e arrogância, mas o faz a fim de demonstrar Sua Glória aos eleitos, que acabam por estar tanto entre gentios como também entre judeus (Rm 9:22-24). Ele, portanto, traz a discussão de volta à questão da incredulidade dos judeus em Cristo, da qual sua discussão sobre a eleição foi uma digressão.

A partir deste ponto, o restante do capítulo é tratado com relação à questão judeu-gentio e a salvação pela fé, em oposição às obras, sem referência explícita à eleição (versos 25 a 33).

A presente interpretação que apresentamos aqui reconhece a significativa mudança de paradigma que ocorre no primeiro século em respeito à identidade do povo de Deus. Ela contrasta com a visão tradicional em termos de manter em mente durante todo o texto as questões dominantes dos judeus e da salvação pela fé.

Ela inicia, como antes, com Paulo angustiado pelo fracasso de Israel em vir à fé em Cristo (Rm 9:1-5). Ele tem que enfrentar a oposição judaica que, se o Evangelho estivesse correto, isto acarretaria que as promessas de Deus aos judeus haviam falhado. Sua resposta é que as promessas de Deus não falharam, mas outros estão herdando-as, porque nem todo Israel é Israel – ou seja, nem todo Israel seguira Abraão em fé (Rm 9:6). Descendência étnica de Abraão não é o suficiente para ser considerado "filho de Abraão", como os exemplos de Ismael e Esaú demonstram; A Israel já foram concedidas bênçãos imerecidas, comparando com outros descendentes de Abraão (Rm 9:7-13). Portanto Deus não é injusto se ele agora está excluindo os descendentes de Jacó que não vêm em fé, porque qualquer um que ele abençoa, mesmo Moisés, é um objeto de Sua misericórdia (Rm 9:14-16). Deus pode optar por poupar um tempo até mesmo para alguém como Faraó, que Deus escolheu endurecer – sabendo que ele mesmo iria se endurecer em resposta ao desafio de Deus – a fim de Deus glorificar-Se a Si mesmo mediante aquela pessoa, o que pode ser visto tanto como um exemplo de misericórdia tanto quanto de endurecimento de Deus (Rm 9:17-18). A implicação é que foi os judeus receberam misericórdia no passado, mas não há garantia de misericórdia no futuro se eles não vierem à fé em Cristo. O interlocutor hipotético pergunta por que Deus ainda culpa os judeus, se foi Ele quem os endureceu (Rm 9:19), recusando-se a reconhecer que os judeus foram endurecidos bem como Faraó o fora, pela sua própria recusa obstinada em se arrepender. Paulo então os repreende, e usa a metáfora oleiro-barro para ilustrar que Deus sempre tratou Israel na base de seu arrependimento, e são apenas aqueles que se recusam a arrepender-se que contra-argumentam que foi Deus que os fez ser como são (Rm 9:20-21). Paulo então argumenta que Deus tem de lidar pacientemente com os "objetos de ira" – os incrédulos – a fim de tornar sua glória conhecida aos "objetos de misericórdia" – aqueles que vêm à fé, e que ele especificamente identifica como vindos tanto não apenas dentre os judeus mas também dentre os gentios (Rm 9:22-24). As citações-suporte de Isaías e Oseias esclarecem o ponto: que muitos daqueles que os judeus pensavam estar excluídos da aliança (os gentios) ao final estavam sendo incluídos, enquanto muitos dos que os judeus achavam estar inclusos na aliança (eles mesmos) estavam na verdade excluídos (Rm 9:25-29). A base segundo a qual os gentios foram incluídos e os judeus não é explicitada em Rm 9:30-33: é que os gentios estão obtendo a justificação mediante a fé, enquanto os judeus a perseguem pelas obras.

Prós e Contras

Pode-se argumentar contra esta interpretação que a tradicional é mais simples e direta do texto em Romanos, e que ela não endereça assuntos do judaísmo étnico ou justificação pela fé, nenhum dos quais é referenciado de modo claro na passagem (Rm 9:14-23). Para tal, podemos responder que a interpretação tradicional é mais simples em virtude da maior familiaridade com ela, e porque assume certas interpretações das citações do Antigo Testamento que são simples mas demonstravelmente falsas, uma vez que o contexto é devidamente compreendido. O assunto do judaísmo étnico domina Rm 9-11, e portanto pode ser seguramente assumido de uma passagem que não o referencie explicitamente, enquanto a justificação pela fé é o tema dominante da Missiva aos Romanos como um todo, e é a rejeição dos israelitas pela justificação mediante a fé que provoca a presente discussão. Por outro lado, a interpretação tradicional lê o texto pressupondo a eleição incondicional individual, que é uma doutrina discutível, certamente não sendo um tema presente em Romanos de 1 a 8, e não seguindo de Romanos 9:25.

Em essência, Paulo está falando do Israel étnico algo muito próximo do que os intérpretes reformados veem. Ele está falando a eles que Deus tem o direito de escolher quem ele quer para estar entre o povo da aliança. Mas ele não está falando isto a eles porque Deus escolheu não eleger a maioria deles. Ele está falando isto porque o paradigma de inclusão no povo da aliança mudou, do Israel que seguia a Lei para qualquer um que venha à fé em Cristo. Israel se sentiu enganada por esta mudança de paradigma, logo Paulo explica que Deus não tem obrigação nenhuma para os descendentes físicos de Abraão; de fato, Paulo demonstra pelo Antigo Testamento que seu relacionamento com Israel sempre foi à base de arrependimento.

OBJETOS DE IRA E DE MISERICÓRDIA (Romanos 9: Uma Leitura Arminiana Sob a Nova Perspectiva)

Objetos de ira e de misericórdia

Objetos de ira e de misericórdia

Sugerir que o propósito do barro é determinado e inalterável do ponto de vista divino vai de encontro à forma como esta alegoria é usada no restante da Escritura: "E se Deus, querendo mostrar sua ira, e dar a conhecer seu poder, suportou com muita paciência os vasos de ira, preparados para a perdição?"(Rm 9:22). Novamente, assume-se aqui que os "objetos de ira" são os não-eleitos, representados por Faraó, Ismael e Esaú. Mas no contexto dos capítulos de 9 a 11, o principal interesse de Paulo é que os judeus não estão vindo a Cristo. Os "objetos de ira", então, são a maioria da nação de Israel. A paciência com a qual Deus tem suportado eles reflete Seu desejo de vê-los arrependidos (Rm 2:4). Não obstante, enquanto eles permanecem como objetos de ira, recusando-se a arrepender-se, eles são preparados para a destruição. "Preparado para a destruição" ecoa Provérbios 16:4:

O Senhor fez tudo para um fim; sim, até o ímpio para o dia do mal. {Provérbios 16:4 Almeida Recebida}

Mas "os perversos" não são necessariamente uma categoria estática: o desejo de Deus é que eles "se arrependam e vivam (Ez 18:23; 30-32).

“E {se Ele fez isto} para que também desse a conhecer as riquezas de sua glória nos vasos de misericórdia, que de antemão preparou para a glória?" {Rm 9:23}

Uma das razões pelas quais Deus tolera os perversos – mesmo aqueles que ele pré-conhece que não se arrependerão – é para fazer conhecidas "as riquezas de sua glória". Podemos racionalmente perguntar como a paciência de Deus alcança este propósito. Podemos facilmente entender como o julgamento de Deus alcançaria isto, demonstrando aos "objetos de misericórdia" o justo julgamento do qual eles foram resgatados. Mas isto não explica como a paciência de Deus em retardar Seu julgamento alcança isto. Talvez isto simplesmente exalta a Soberana Majestade de Deus – Ele não precisa amedrontar ou "fazer alguma coisa" com os perversos: seu fim já está assegurado. Mas parece mais razoável reconhecer que os "objetos de sua misericórdia" são neste momento "objetos de ira" (Ef 2:3) mas escaparam de tal ira mediante o arrependimento e a fé. Para eles, certamente, as "riquezas de Sua Glória" são realmente reveladas, porque eles reconhecem que só pela misericórdia de Deus durante sua vida pregressa de rebelião é que eles receberam esperança de salvação. Portanto, as categorias "objetos de ira" e "objetos de misericórdia" são dinâmicas, não estáticas. A inclusão de um indivíduo nestas categorias é baseada na resposte deste mesmo indivíduo à oferta da graça. [1]

No verso seguinte, Paulo torna-se mais explícito na sua identificação dos "objetos de misericórdia". Eles são "nós, a quem ele também chamou, não só dentre os judeus mas também dentre os gentios" (Rm 9:24). Aqui Paulo explicitamente volta ao tema original (Rm 1-6), apoiando a ideia as qual que ele jamais se afastou. A ofensa aos judeus é que Deus está agora abertamente chamando pessoas dentre os gentios, bem como aquelas dentre os judeus que aceitaram a fé em Cristo. Paulo sustenta seus comentários a partir de mais citações do Antigo Testamento. Ele cita Oseias 2:23 e 1:10 no sentido de que aqueles que anteriormente não eram incluídos na nação da aliança seriam incluídos entre aqueles que ele chama "meu povo". Ademais, ele cita Isaías 10:22-23 e 1:9 no sentido de os salvos dentre Israel seriam apenas o "remanescente".

Em outras palavras, para aqueles judeus que se valiam da etnia e aderência à Lei para sua inclusão entre o povo de Deus, Paulo mostra a partir das próprias Escrituras Hebraicas que eles não tinham razão alguma para contar com isto. Portanto, ele sumariza seu próprio argumento nos versos 30 a 32. "Os gentios, que não procuravam a justiça, a obtiveram". De que maneira? "Pela fé". Paulo deixa claro que é este o critério, esta é a questão: gentios estão vindo à justificação pela fé. Israel, entretanto, adotou "uma lei de justiça ... não pela fé mas como que pelas obras". A questão não é que Deus soberanamente escolheu apenas uns poucos judeus mas muitos gentios; a questão é que Israel rejeitou a fé como a característica determinante da nação da aliança, em favor de continuar a confiar na Lei. Portanto, o dom gratuito da salvação pela fé em Cristo é uma pedra de tropeço para os que não creriam, mas "aquele que nela confia não será envergonhado" (Rm 9::33, citando Is 8:14, 28:16).


[1]Certamente, tudo isto levanta a questão de se e como os réprobos são habilitados a vir à fé em Cristo. Se eles não o são, à parte da aplicação da graça irresistível destinada somente aos eleitos, então a posição calvinista se mantém mesmo com esta interpretação. Uma discussão detalhada das passagens relevantes de Efésios 2 está fora do âmbito deste estudo; porém, é discutível que os dois primeiros capítulos de Efésios também tratam do relacionamento entre judeus e gentios, como é deixado claro no restante do livro, e que o ponto de Paulo em Efésios 2 é identificar os crentes judeus ("nós também", Ef 2:1) com os gentios (destinatários) em sua comum experiência de serem "mortos em delitos e pecados" antes da conversão, se referência específica de como a conversão fora efetuada.

O OLEIRO E O BARRO (Romanos 9: Uma Leitura Arminiana Sob a Nova Perspectiva)

O Oleiro e o Barro

O Oleiro e o Barro

Então, o interlocutor se pergunta "Por que Deus ainda nos culpa?" A disputa dos intérpretes reformados sempre foi que se os arminianos estivessem corretos, a resposta óbvia ao interlocutor seria que o interlocutor deve usar seu livre arbítrio para vir a Deus em fé; se ele o fizesse, não seria condenado. Porém, isto é um mal-entendido. O interlocutor não pergunta por que Faraó ou os judeus não podem vir a Deus em fé; o interlocutor está perguntando por que a fé em Cristo deve ser necessária. Isto é, como pode Deus culpar o judeu por esperar estar entre o povo escolhido porque ele é judeu? – em outras palavras, porque ele era descendente de Abraão e porque ele guardava (num sentido relativo) a Lei? Como pode Deus culpar os judeus por falharem em vir à fé em Cristo, visto que a fé não era o que os judeus foram levados a esperar como critério para eleição?

Pode ser objetado que nem a questão judeu/gentio nem a fé são de contexto imediato aqui. Devemos lembrar que justificação pela fé forma a base do raciocínio de Paulo em todo o trecho de Romanos 1-8, e que Romanos 9-11 forma uma resposta estendida para o que esta doutrina significa para os judeus. Paulo está defendendo sua tese que a palavra de Deus jamais falhou, e que nem todo descendente de Israel constitui o Israel de Deus (Rm 9:6). Paulo explicitamente chega a esta conclusão de seu argumento em Romanos 9:30-32. Somente separando Rm 10-24 do contexto é que esta passagem seria interpretada primariamente em termos da eleição incondicional individual.

Paulo então responde a seu interlocutor, "Quem és tu, ó homem, para retrucar a Deus?" (Rm 9:20). Se a questão do verso 19 significar "Por que os reprovados são julgados por não terem vindo à fé?" a resposta continua insatisfatória. Mas se a questão significar "Por que as pessoas escolhidas por Deus – Israel – têm que vir à fé em Cristo?" então a resposta faz bastante sentido. Não nos cabe definir os critérios de Deus para inclusão na comunidade da aliança.

Paulo então parafraseia um trecho de Isaías 29:16 em apoio à sua recusa do interlocutor. "Pode a coisa criada dizer a quem a criou “por que me fizeste assim?"” (Rm 9:20). A seção de Isaías da qual esta paráfrase foi feita é digna de nota:

[13] Por isso o Senhor disse: Pois que este povo se aproxima de mim, e com a sua boca e com os seus lábios me honra, mas tem afastado para longe de mim o seu coração, e o seu temor para comigo consiste em mandamentos de homens, aprendidos de cor; [14] portanto eis que continuarei a fazer uma obra maravilhosa com este povo, sim uma obra maravilhosa e um assombro; e a sabedoria dos seus sábios perecerá, e o entendimento dos seus entendidos se esconderá. [15] Ai dos que escondem profundamente o seu propósito do Senhor, e fazem as suas obras às escuras, e dizem: Quem nos vê? e quem nos conhece? [16] Vós tudo perverteis! Acaso o oleiro há de ser reputado como barro, de modo que a obra diga do seu artífice: Ele não me fez; e o vaso formado diga de quem o formou: Ele não tem entendimento? {Isaías 29:13-16 Almeida Recebida}

Claramente este trecho se refere a pessoas cuja adoração a Deus é meramente pretensa, e que pensam que podem planejar e fazer o mal sem o conhecimento ou a interferência de Deus. Não apenas nesta passagem, que é diretamente citada em parte, mas de fato em todas as passagens nas quais esta ilustração barro-oleiro é usada (Is 45:1-13, 64:4-8; Jr 18:1-10) se referm a pessoas que estão debaixo de julgamento por causa de sua falsa adoração e desprezo a Deus e Sua Lei, e ou implica ou especificamente oferece restauração aos arrependidos (Is 29:17-19, 45:14,22; 64:9-12). Jeremias 18:6-10 claramente indica que o "barro" não é meramente passivo:

[1] A palavra que veio do Senhor a Jeremias, dizendo: [2] Levanta-te, e desce à casa do oleiro, e lá te farei ouvir as minhas palavras. [3] Desci, pois, à casa do oleiro, e eis que ele estava ocupado com a sua obra sobre as rodas. [4] Como o vaso, que ele fazia de barro, se estragou na mão do oleiro, tornou a fazer dele outro vaso, conforme pareceu bem aos seus olhos fazer. [5] Então veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: [6] Não poderei eu fazer de vós como fez este oleiro, ó casa de Israel? diz o Senhor. Eis que, como o barro na mão do oleiro, assim sois vós na minha mão, ó casa de Israel. [7] Se em qualquer tempo eu falar acerca duma nação, e acerca dum reino, para arrancar, para derribar e para destruir, [8] e se aquela nação, contra a qual falar, se converter da sua maldade, também eu me arrependerei do mal que intentava fazer-lhe. [9] E se em qualquer tempo eu falar acerca duma nação e acerca dum reino, para edificar e para plantar, [10] se ela fizer o mal diante dos meus olhos, não dando ouvidos à minha voz, então me arrependerei do bem que lhe intentava fazer.{Jeremias 18:1-10 Almeida Recebida}

Deus soberanamente decidiu o que fazer acerca do barro: ele resolveu responder ao barro de acordo com seu arrependimento ou obstinação. Citando a metáfora oleiro/barro em Romanos 9:20, Paulo essencialmente afirma aos judeus que Deus lidará com eles de acordo com o seu arrependimento – como Ele sempre disse que faria. O "barro" aqui na citação não se refere aos não-eleitos; se refere a Israel, que não sente ser necessário vir a Cristo. O interlocutor que acredita que Israel deveria ser salvo por causa de sua etnia é lembrado que o arrependimento sempre foi requerido para a salvação – até mesmo a do judeu. A imagem é do barro culpando sua posição sobre o oleiro, em vez de humildemente pedir para ser remoldado.

Paulo então pergunta, "Não tem o oleiro direito sobre o barro, para fazer um vaso para honra e outro para desonra?". A ofensa aqui é precisamente que Israel, que se imaginava um "vaso para honra" em comparação aos gentios, que estariam na posição de vasos de desonra. Significativamente, em 2Tm 2:20-21, Paulo indica que as escolhas de uma pessoa determinam que tipo de uso se fará delas:

[20] Ora, numa grande casa, não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de madeira e de barro; e uns, na verdade, para uso honroso, outros, porém, para uso desonroso. [21] Se, pois, alguém se purificar destas coisas, será vaso para honra, santificado e útil ao Senhor, preparado para toda boa obra. [22] Foge também das paixões da mocidade, e segue a justiça, a fé, o amor, a paz com os que, de coração puro, invocam o Senhor. {2 Timóteo 2:20-22 Almeida Recebida}

FARAÓ (Romanos 9: Uma Leitura Arminiana Sob a Nova Perspectiva)

Faraó

Faraó

Paulo reforça sua afirmação de que a doutrina de fato não implica injustiça em Deus citando Ex 33:19, em que, em referência a Moisés, Deus afirma:

Porque diz a Moisés: Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia, e terei compaixão de quem me aprouver ter compaixão.{Romanos 9:15 Almeida Recebida}

Como em Romanos Paulo segue para discutir o Faraó em Êxodo, esta citação é ordinariamente entendida para primariamente implicar sua negação – que Deus tem também o direito de recusar misericórdia e compaixão a quem Ele quiser. Porém, em seu contexto original no Livro do Êxodo, Deus não faz esta afirmação para justificar Sua recusa de misericórdia a alguém, mas sim para justificar sua concessão a Moisés de mostrar-lhe Sua Glória (Ex 33:18). Isto vem do contexto mais amplo do episódio do bezerro de ouro e da destruição das primeiras Tábuas do Testemunho (Ex 32-33). A conversa de Moisés com Deus (Ex 33:12-20) aparenta revelar uma preocupação genuína de que Deus abandonaria Seu povo e que Moisés seria deixado para guiá-los por conta própria. O fato de Moisés ter que talhar o segundo o segundo par de Tábuas levou alguns especialistas a sugerir que Moisés não era totalmente indesculpável na sua resposta aos israelitas. Uma subsequente explosão de raiva impediria Moisés de adentrar a Terra Prometida. Não obstante, Deus escolheu ter misericórdia de Moisés e permiti-lo ver Sua Glória. Portanto, como Paulo nota em Rm 9:16, o favor de Deus "não depende do desejo ou esforço do homem, mas da misericórdia de Deus". Mesmo Moisés não recebeu bênçãos como resultado de seguir a Lei ou ser da descendência de Abraão. Ele foi um receptor da graça de Deus. Aqueles que esperam as bênçãos de Deus baseados em etnia ou em seguir os mandamentos divinos não poderiam se exaltar nisto, nem mesmo acima de Moisés a este respeito!

Paulo então se torna para Faraó:

Pois diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te levantei: para em ti mostrar o meu poder, e para que seja anunciado o meu nome em toda a terra. {Romanos 9:17 BLIVRE}

Isto é tipicamente tomado como significando que Faraó foi posto numa posição de poder especificamente para ser destruído pelas pragas no Egito, e então significando que Deus pode, com justiça, criar pessoas para o propósito de condená-las e assim glorificar-Se a Si mesmo. Novamente, examinando-se a citação em seu contexto original nos dá outra visão:

Pois agora eu estenderei minha mão, para te ferir a ti e ao povo com pestilência; e serás tu cortado da terra.E deveras por este motivo eu te levantei, para mostrar em ti o meu poder, e que meu nome seja anunciado por toda a terra. {Êxodo 9:15-16 King James}

Em outras palavras, o ponto que o SENHOR levanta em Faraó não era que Ele iria destruir Faraó para mostrar Seu poder, mas que Ele não havia ainda destruído Faraó, a fim de demonstrar Seu poder. A nota de margem da Bíblia NIV captura este sentido perfeitamente – o poder de Deus fora demonstrado precisamente para poupar Faraó e não para destruir o Egito mais rapidamente. 1 O contexto maior, Ex 13:17, coloca esta afirmação em um de vários apelos a Faraó para que deixe Israel ir embora, ou então outra praga virá, e especificamente acusa Faraó pela sua própria obstinação em recusar o povo a ir.

Portanto, quando Paulo em Romanos 9 chega à conclusão de que "Deus tem misericórdia de quem Ele quer ter misericórdia, e ele endurece a quem quer endurecer" (Rm 9:18), tipicamente se entende que Faraó é o exemplo de Deus de endurecimento. De fato, como a citação demonstra, Faraó foi tanto um exemplo de misericórdia quanto de endurecimento de Deus. Deus é misericordioso com Faraó até certo ponto, em que Ele não destrói o Egito imediatamente, mas adverte o Faraó através das pragas. Ele também, como sabemos, endureceu Faraó também, apesar de se afirmar que Faraó endureceu a si mesmo.

Mas o que fazer do endurecimento de Faraó por Deus? Paulo não cita passagem alguma referente diretamente ao endurecimento de Faraó, nem explica como se dá tal endurecimento, apesar de claramente se referir a ele. Em Êxodo, o endurecimento do coração de Faraó é expresso de quatro maneiras: o Senhor profetiza que Ele endurecerá o coração de Faraó (Ex 4:21; 7:3; 14:4); o endurecimento é citado passivamente, sem um sujeito expresso ("O coração de Faraó foi endurecido": Ex 7:13,22; 8:19; 9:35); é relatado que Faraó endureceu seu próprio coração (Ex 8:15,32; 9:34); e o Senhor endurece o coração de Faraó (Ex 9:12,10:1,20,27; 11:10; 14:8). Em geral, o endurecimento é expresso passivamente ou atribuído a Faraó nas primeiras pragas, e atribuído mais frequentemente à ação direta do Senhor nas pragas seguintes. Uma maneira de olhar para este endurecimento, portanto, é que Faraó incorre em julgamento sobre si mesmo ao endurecer seu próprio coração inicialmente, e depois ele fora endurecido pelo Senhor, para mostrar o poder de Deus. O Senhor, certamente, já sabia o que iria acontecer, e pré-alertou Moisés deste fato.

Outra maneira de olhar a este endurecimento é reconhecendo vários tipos de causação. O que o Senhor realmente faz é confrontar Faraó por intermédio de Moisés e enviando as pragas. O que Faraó faz é responder recusando a demanda de Moisés; em outras palavras, endurecendo seu coração. Faraó portanto endurece seu próprio coração, no sentido em que ele mesmo escolhe responder assim; o Senhor endurece o coração de Faraó, no sentido de lhe fornecer o ímpeto para Faraó responder daquela maneira. Do mesmo modo, podemos dizer que uma pessoa nos irritou, mas de fato aquela pessoa meramente forneceu o ímpeto para que nos tornássemos agressivos; fomos nós que respondemos em ira.

De todo modo, não tem como imaginar que Deus forçou Faraó a endurecer seu coração à parte dele mesmo; em outras palavras, que Deus fez Faraó endurecer seu coração quando ele de outra maneira não havia feito. Qualquer pessoa concordará que Faraó era culpado pelo seu próprio endurecimento, não importando se ele era predestinado ou não. O fato de Deus "endurecer a quem ele quer" não anula o fato de que aqueles a quem Ele endurece, também se endurecem a si mesmos. Em outras palavras, somos informados que Deus endurece a quem lhe apraz, mas não em que base ele endurece alguns e não a outros.

Esta discussão sobre o endurecimento de Faraó se torna relevante na interpretação de Romanos 9 quando examinamos o verso a seguir: "Um de vocês me dirá, Então por que Deus ainda nos culpa? Pois quem tem resistido à sua vontade?" (Rm 9:19). Tipicamente, o entendimento deste verso é ver Faraó, como o típico não-eleito, sendo endurecido pelo Senhor, não obstante responsabilizado por Deus, e ver o hipotético interlocutor questionando a justiça desta situação. "Como pode Deus responsabilizar Faraó", o interlocutor se pergunta, "ou por extensão, qualquer não-eleito, quando Ele Mesmo predestinou tal resposta?". Portanto, Então, a típica interpretação vê o interlocutor como espelhando precisamente a posição arminiana (veja, por exemplo, Institutes 3.22.8)

Esta interpretação, porém, faz o hipotético interlocutor identificar-se muito fortemente com Faraó. (A NIV reconhece este problema fazendo o objeto do ódio do Senhor "nós", apesar de o grego não prover tal referência.) O interlocutor não tem nenhum interesse em saber se Deus tratou Faraó com justiça! Ele vê, isto sim, o ponto que Paulo está fazendo com relação ao Israel étnico. Deus não é injusto (Rm 9:14) em escolher gentios que tenham fé, ao contrário dos judeus que tentam manter a Lei, porque Deus "tem misericórdia de quem Ele quer e endurece quem Ele quer" (Rm 9:18). Se Deus quiser ter misericórdia daqueles que vêm a Ele pela fé, e endurecer aos que não vêm, não levando em conta sua etnia ou obediência à Lei, isto é assunto de Deus. O ponto de Paulo acerca de Faraó não é que Deus teve misericórdia de Moisés e reprovou Faraó, o que facilmente encaixaria com o entendimento natural de um judeu; o ponto é que Deus tem todo o direito de definir soberanamente os critérios de sua misericórdia ou endurecimento.


1

Como na Septuaginta, dietarathas, mantido ou preservado. Rm 9:17 usa exegeiro, levantar, mas no senso de despertar do sono ou sendo incitado. Não significa algo como "levantado a uma posição de poder". A única ocorrência além desta no Novo Testamento é 1Co 6:14, referente à ressurreição dos crentes.